Sobre arte, música e crescer por Amanda Miranda

Sobre arte, música e crescer por Amanda Miranda

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A Estimulação sensorial / cognitiva busca desenvolver e integrar os processos e  estratégias das  vias sensoriais, tornando-as base da construção do pensamento, da linguagem e da nossa expressão íntima

 Amanda de uma forma simples, mas com enorme sensibilidade,  nos leva em sua narrativa pelos caminhos da alma , dos sentidos e do corpo através da escuta e da amplificação do diálogo que se trava entre o nosso ser e os elementos da música/arte . Fica fácil e sobretudo claro, compreender como a música permeia e edifica a nossa vida e de como sem arte, sem criatividade a vida se esvazia.

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“The eARTh whithout ART is just… ‘eh'” – Amanda Miranda

A frase acima de autor desconhecido é um daqueles fenômenos da internet que circulam pelo mundo de maneira irrefreável à velocidade da luz. Veio para mim em um dia de chuva naquela onda de informações curtas e rápidas, algumas úteis, outras nem tanto, enquanto bisbilhotava a internet. Pessoalmente, vejo esta frase como um pequeno achado no borbulhar virtual. Para os entendedores da língua inglesa a mensagem é simples e marcante; em tradução livre, “a terra sem arte é qualquer coisa, menos terra, de tão sem graça”. No português o jogo de palavras não é válido, mas arte é arte em qualquer lugar do planeta. E de fato, a arte é uma necessidade. É o alívio quando preciso, é o caos quando movimento. A arte é o pulso das energias do mundo e de cada ser humano que pisa nele. Mas sou suspeita. Como artista profissional, não poderia pensar diferente. A arte não só me move como me alimenta.

Romancear a arte é metalinguagem e é uma coisa deliciosa de se ver, mas com uma certa frequência, para relembrar os desmemoriados, é necessário falar de forma profunda e respeitosa sobre sua importância no desenvolvimento do ser humano. Para isso partiremos da música, a ponte cognitiva que leva uma criança da diversão à linguagem e à compreensão de mundo com sutileza e prazer, abrangendo o corpo e suas funções como um todo.

Harmonia. Melodia. Pausa. Ritmo. Tempo… Pensando como adultos que somos não é difícil revisitar as sensações que diferentes tipos de música nos causam. Algumas canções nos fazem querer bater cabeça, outras, mexer o quadril, algumas outras provocam movimentos invisíveis como um frio na barriga ou a vontade de chorar, isso porque já estamos impregnados de signos e memória. Com a criança não é muito diferente, com a diferença de que ela ainda está para descobrir os signos. Ela ainda está fazendo história. Ela está atenta ao mundo, pronta para receber, perceber e ressignificar. A música, essa energia vibrante que atinge diretamente os ouvidos, tão pertinho do cérebro, faz o corpo se movimentar de maneira intensa e completa energeticamente atingindo o emocional e o físico simultaneamente. Esse poder musical é onde reside a importância da musicalização infantil.

– A inteligência científica e a linguagem

Música é matemática e a ciência não é um mistério, é uma mistura de dados concretos, testes e resultados, não distantes da criação e da criatividade. A música é nada mais nada menos que o resultado de cálculos, onde tempo, ritmo, soma, divisão, altura, frequência, física e pesquisa estão presentes. Por mais simples que algumas canções possam soar, elas sempre estarão carregadas de todos esses aspectos, sem exceção. E não é preciso muito mais do que isso para entender que todo esse conhecimento pode ser passado de maneira cativante para uma criatura que acabou de chegar ao mundo. Os sons são percebidos desde a mais tenra idade, o que facilita a inserção desta arte na vida da criança. A música ajuda a diferenciar, por exemplo, o grito da fala em lugar comum, através de signos sonoros e intensidade, passa a entender a passagem do tempo de maneira mais abrangente, passa a compreender melhor os números e as contagens. A música ajuda no desenvolvimento da compreensão rítmica, separação de partes, além de estimular o lado criativo, onde estão as abstrações a procura de signos no nosso cérebro. Os estímulos sonoros, quando ajustados, podem ajudar na concentração e no controle do ritmo de vida da criança. Não raro vemos as famosas canções de ninar, que nos levam à parte da linguagem. Quando a canção e os exercícios musicais possuem letras, a gama de possibilidades de ensinar é aumentada exponencialmente, porque através da palavra é possível inserir qualquer tipo de tema para o aprendizado, como por exemplo cores, animais, formas geométricas, história, números, desta vez de forma literal e explícita. Não raro vemos padrões de repetições nas canções infantis que auxiliam esse aprendizado através da memorização, isso tudo sem contar a própria inserção da comunicação verbal. A palavra quando inserida na música gera o estímulo da fala na criança, auxiliando-a na expressão verbal e na comunicação, o que nos leva ao tópico seguinte.

– A inteligência emocional

A combinação dos sons é matemática, mas toda essa mistura quase mágica se transforma em arrepios, lágrimas, sorrisos e outras sensações visíveis ou invisíveis no nosso corpo. Aliada à parte matemática, é clara a influência da música nos sentidos. Música que causa arrepio, música que causa tristeza, música que causa uma alegria repentina. A mistura matemática resulta em sonoridades diferentes que por sua vez, como foi dito anteriormente, atingem o corpo de maneira completa. Da música nada se desperdiça. Através da música é possível fazer com que a criança entenda o que ela está sentindo e junto à comunicação verbal é natural que com o tempo ela consiga se expressar de maneira cada vez mais clara, sem tabus. A música estimula as emoções e ajuda na distinção destas emoções e suas sutilezas, como por exemplo a identificação da melancolia não apenas como uma tristeza generalizada ou da euforia como alegria comum. Música é capaz de causar sonho ou saudade. Quando crianças também já sentimos saudades, mesmo quando não a identificamos, ainda, como tal. Além das emoções básicas, a música pode desenvolver a empatia, o instinto de solidariedade e o companheirismo através dos trabalhos voltados para a coletividade. Música em sua maioria das vezes é um trabalho que exige mais de uma pessoa e que não só demanda técnica, mas também o que chamamos de “feeling”, o sentir.

– O corpo e a música

Para fechar o ciclo completo da influência da música nos pequenos (e em nós, grandões!), falemos sobre a coordenação motora. Como dito no tópico acima, a música nos causa emoções, sensações, provoca o corpo como um todo. Não obstante, sentimos aquela vontade de pular, ou correr, ou se agachar no canto do quarto ou só fechar os olhos e bater o pé ao ritmo do som. Com a criança é a mesma coisa. Ao ouvir determinado som marcante, o corpo dela sofre a influência e responde com o sistema nervoso, ativando as famosas dancinhas muitas vezes desengonçadas de início. Com o tempo e a prática, a criança passa a desenvolver a propriocepção. Ela acaba encontrando o corpo no próprio corpo e o lugar do seu corpo no mundo. Encontrar-se é uma sensação única e a música ajuda na busca do ser como ele é, que gera a identidade desde o íntimo de forma profunda e significativa.

Por isso termino retomando o alívio e o caos. A música pode ser a paz ou a fonte de onde brota a vontade de causar e em qualquer estilo todos esses aspectos expostos estarão inseridos. De alguma forma estaremos aprendendo e nos desenvolvendo por inteiro. Se como adultos leve ou pesadamente enrijecidos pela estrutura do mundo atual, cheios de compromissos e correndo atrás do tempo, já podemos sentir com força todas essas influências, o que acontecerá no corpo de uma criança, pronto para a recepção, ao absorver essa gama infinita de possibilidades sonoras? Com a música a dicotomia corpo/cérebro não funciona, é restrita. Esta arte demanda e oferece completude, ajuda o corpo a se desenvolver sem se partir. A música permite o encontro do corpo com ele mesmo de maneira gentil e generosa, de forma lúdica e às vezes de maneira devastadora. E essas escolhas somo nós que fazemos ao determinar com o tempo o que gostamos de ouvir. Quanto maior a variedade, mas rica é a experiência de uma criança ou mesmo de um adulto em busca de melhorias pessoais.

E assim como os profissionais, podemos todos não só ouvir música e apreciar a arte, mas também fazer da arte um alimento para a alma.

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